domingo, 8 de agosto de 2010

Manchete: Maluco vestido de galinha mata açougueiro

Norte da Califórnia, 1967. Naquele tempo os açougues eram avulsos... Um homem alto, ruivo, forte de gordura, de barba espessa, vestindo uma camisa xadrez curtida, que já não aguentava mais o volume do corpo escandinavo, entra no talho e encara o velho franzino atrás do balcão. Roy Stern é o nome do ancião. Ele passou grande parte de sua vida naquele local, atrás do balcão, matando e vendendo, vendendo para comer, comendo para matar, e matando para, quem sabe, não morrer. Desde que seu pai, fazendeiro rico, homem influente na região, havia perdido tudo no início do século, Roy permanecia naquele posto de sacrificador. Aquele comércio era a única coisa que o fazendeiro havia deixado, quando no verão de 1930, depois da depressão do ano anterior, acertou um tiro na cabeça. O velho comerciante tinha uma relação contígua com a morte. Pelo menos uma vez por dia ensanguentava sua camisa branca e, resmungando confissões de sua infância, pendurava pedaços no matadouro.

Dunn Huply, o homem da barba espessa, mais conhecido como “Dunply”, havia regressado do Alasca a pouco, depois de uma dura temporada de experimentação de solidão humana. A sua tolerância era precária com pessoas, só dialogava bem com animais. Dunply sabia da fama de açougueiro sanguinário de Roy, e há dias não mantinha uma relação harmoniosa com ele. Não se intimidou com a expressão forte estampada no rosto de Roy, e foi logo fazendo seu pedido, que mais parecia uma ordem:

- Eu quero um frango vivo!

Roy, que ainda mantinha a testa franzida respondeu com um sotaque interiorano:

- Só trabalho com animais mortos, se quiser ver bicho vivo vá pra outro lugar, e não venha me aporrinhar novamente, seu grande pedaço de merda!

Dunply, que apesar de intolerante sempre mantinha uma excêntrica calma, virou as costas e encostou a porta ao sair. As cordilheiras já alcançavam o sol quando ele saiu, bufando, rumo ao seu casebre que não era tão longe dali. Não tirou da cabeça aquele insulto.

Ao chegar a casa - já era noite - deixou seus pertences em uma bancada e foi direto para oficina que ficava nos fundos da ruína de madeira que estava abrigando-o nos últimos tempos. Com certa dificuldade acendeu uma lamparina ligada a uma fiação no alto do cômodo, e quando a luz veio Dunply foi, fugaz, ao encontro de um armário, acabado, escondido nos fundos da oficina por uma grande quantidade de entulhos. Tirou tudo de cima e ao abrir o armário seu rosto ganhou uma nova feição, ele sorriu. Um saco cheio de penas brancas. Pegou uma cola de sapatos que estava por ali e começou a se banhar com aquilo. Depois que seu corpo estava completamente coberto de cola, ele foi, calmamente, colocando pena a pena nos seus membros, até ficar completamente preenchido, deixando exposta somente a espessa barba ruiva.

Dunply pegou uma serra cega que estava em sua bancada e abandonou sua casa. Com passos largos, acelerados foi em direção ao açougue de Roy Stern.

A lua cheia iluminava o ambiente e, naquela noite, Dunply pôde ver suas penas brancas atingirem o tom de sua barba espessa.

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